Os deputados da Espanha iniciam nesta terça-feira (30/01) a análise do projeto de lei que visa dar anistia aos independentistas catalães. O debate no plenário será seguido de votação. A proposta faz parte dos acordos firmados pelo primeiro-ministro Pedro Sánchez para conseguir o apoio necessário à sua reeleição, no ano passado.

Se a anistia for aprovada na Câmara Baixa, o texto segue para o Senado, onde poderá passar até dois meses em tramitação.

Para ser aprovada no Congresso dos Deputados, a proposta de lei de anistia precisa contar com o sinal verde da maioria absoluta da casa. Dos 350 deputados, pelo menos 176 teriam que votar a favor da lei que concede o perdão de delitos relacionados ao processo soberanista da Catalunha.

Tudo leva a crer que 178 parlamentares da Câmara Baixa espanhola aprovarão o texto. A proposta seguirá, então, para o Senado, onde o Partido Popular, de direita e opositor do governo, tem maioria. Com isso, é provável que os prazos de tramitação sejam dilatados, ainda que não possam superar os dois meses, tempo limite para que a lei volte ao Congresso dos Deputados para sua aprovação definitiva.

Em uma reviravolta judicial nas vésperas da votação, juízes que investigam a atuação de separatistas da Catalunha prolongaram as investigações por seis meses.

 

Cenário de incertezas

Apesar do resultado da votação ser aparentemente previsível, o panorama é impreciso, com algumas forças políticas ainda apostando em incorporar mudanças ao projeto de lei antes de aprová-lo. Existem partidos especialmente interessados na proposição de emendas.

O Juntos pela Catalunha, de Carles Puigdemont, e o Esquerda Republicana da Catalunha, ambos independentistas, estão insatisfeitos com a atual redação da lei, principalmente no que diz respeito a quem não poderá ser beneficiado pela anistia.

O texto aprovado na Comissão de Justiça do Congresso dos Deputados na terça-feira passada prevê que, entre os acusados de terrorismo, só serão anistiados aqueles que não tenham cometido graves violações dos direitos humanos.

No entanto, as duas siglas independentistas insistem que todos os delitos de terrorismo que estejam enquadrados no contexto da lei de anistia devem ser perdoados.

Apesar disso, a imprensa espanhola tem divulgado que o governo nacional não parece estar disposto a introduzir novas modificações na lei por pressão dos seus aliados. Os independentistas, por outro lado, demonstram estar prontos para negociar emendas até o último momento do debate desta terça-feira (30).

Diante de tanta incerteza, alguns meios de comunicação espanhóis estão especulando inclusive a possibilidade de que os deputados do Juntos pela Catalunha votem contra a lei – para que o texto volte à Comissão de Justiça e possa continuar em debate.

 

O caso Puigdemont

Durante toda a negociação acerca da anistia, o líder separatista Carles Puigdemont figurou entre os principais beneficiados com a possível aprovação da lei. Entretanto, existe a possibilidade de que ele não esteja entre os contemplados. Esta é uma das razões pelas quais o Juntos pela Catalunha segue promovendo a ideia de reformar o texto atual antes de aprová-lo.

A situação de incerteza sobre a anistia de Puigdemont, que era governante da Catalunha durante a tentativa de independência da região, em 2017, aumentou ainda mais nesta segunda-feira (29/01), quando dois juízes responsáveis pela apuração dos fatos ligados ao processo separatista prolongaram as investigações.

Joaquín Aguirre, do Tribunal de Barcelona, investiga se os independentistas por trás da tentativa de separação da Catalunha do restante da Espanha tiveram apoio da Rússia para proclamar a independência da região. Às vésperas da votação da lei de anistia, ele prorrogou por seis meses o período de investigações do caso.

 

Conexão com a Rússia?

Se as evidências observadas por Aguirre comprovarem uma conexão entre Puigdemont e Moscou, ele pode acabar não sendo anistiado, já que o projeto de lei de anistia não prevê o perdão de “delitos de traição” e contra a paz do Estado, além de delitos que tenham colocado em xeque os interesses financeiros da União Europeia.

O juiz Manuel García-Castellón, da Audiência Nacional, responsável pelo processo relacionado ao “tsunami democrático”, outro desdobramento independentista, também prorrogou por seis meses a investigação relacionada ao caso.

García-Castellón emitiu um documento no qual faz novas acusações de terrorismo contra líderes independentistas, incluindo Puigdemont, vinculando-os a graves agressões a policiais em 2019 e invocando o artigo 2 da Convenção Europeia de Direitos Humanos, que diz respeito ao direito à vida.

Como os crimes de terrorismo que violam gravemente os direitos humanos não serão perdoados com a anistia, segundo o texto atual do projeto de lei, se ficar comprovada a versão apresentada pelo juiz, Puigdemont não poderia ser anistiado.

 

Fonte: Opera Mundi
Foto: Wikimedia Commons